(pequena nota)
1. Em
http://filosofiamaisciencias2.blogspot.pt/2015/05/os-passos-que-o-tempo-da.html escrevi que o motivo de movimento em Aristóteles era prioritário sobre o de tempo, que Ser e Tempo privilegia no título. Era uma espécie de critica
a Heidegger, mas o tempo nesse grande texto é, tanto quanto me parece
lembrar-me, a temporalidade do Dasein, do ser no mundo, o qual, ‘ser’, se destaca contudo do que será o Ser
posteriormente, o que dá e retém a doação. Se creio certo que o motivo
aristotélico de ‘movimento’ não aparece explicitamente em Heidegger, é
provavelmente porque restringido ao ‘ente’ e deixando as suas marcas nos
‘acidentes’ que, relevando do movimento e portanto do tempo, como que se
‘substancializam’ como ‘qualidades’ do ente, que duram, permanecem. Tudo coisas
com que Heidegger está rompendo. Como parece testemunhar o texto sobre a phusis em Aristóteles de 1940 (Questions II), em que a análise da ousia se faz como o que se explica pelo movimento, mas
sem que este ganhe qualquer primazia (escrevo esta pequena nota de cor, sem ter
ido olhar de novo os textos, segundo o que creio ser a lógica do pensamento
heideggeriano).
2. Ora, Tempo e Ser, a conferência de 1962 que se apresenta como o
acabamento do percurso que vem desde 1927, torna claramente o tempo como
dependente do que o dá ao ente, e isso que o dá (não sendo por certo o
movimento, de nível ôntico) tem em todo o caso precedência sobre o tempo, pois
que de nível ontológico. A temporalidade do ente deve relevar do nível ôntico,
onde se passam os movimentos e os acontecimentos, com que o Ereignis não se confunde (embora, contra uma observação de
Derrida, acho que se deve traduzir por Acontecimento, sentido corrente de Ereignis
em alemão): a diferença
ontológica em 62 é entre o ontológico Ereignis (que é ‘nada’) e os ônticos tempo e ser (só em
entes que ‘são’), senão o texto perderia todo o sentido. Enquanto que em
Aristóteles, a ousia parece
ser o nível ‘ontológico’ e os movimentos relevarem do ‘ôntico’, do
fenomenológico ou physico, já que a ousia é tratada na Metaphysica
aquém ou além do movimento, em Heidegger 62 haverá saída da ontoteologia (em Aristóteles,
esta predomina por definição!)
como atesta justamente o motivo de Acontecimento com a sua pluralidade anterior
à unidade de cada ente que se jogue, seja doado e/ou transformado, nos
acontecimentos dados. É por
isso que creio poder falar em acabamento de 62 em relação a 27, já que a
ruptura deste com Husserl, segundo a lição de João Paisana, foi justamente com
o ‘objecto’ definido, retorno ao quotidiano do Dasein, isto é início da saída da ontoteologia.
3. O que Heidegger não fez nos
seminários que comentam Tempo e Ser nem nos seguintes foi tirar a conclusão desta viragem – deste III
Heidegger! – para o Dasein.
Nunca o ser no mundo é dito
ou aludido como doado em
multiplicidades pelo
Acontecimento (ou pela Terra –
Mundo dos anos 30, quando o termo de Ereignis lhe surgiu).
Sem comentários:
Enviar um comentário