adenda a
AS CIÊNCIAS DAS
SOCIEDADES
NUMA ABORDAGEM FENOMENOLÓGICA
http://filosofiamaisciencias.blogspot.pt/2015/11/as-ciencias-das-sociedades-numa.html
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Cosmopolitismo e secularização
O espaço de saber espiritual
A secularização económica
A “instituição” secularizada: da Igreja romana ao Estado do século XIX
Breve caracterização do messiânico
Dos movimentos espirituais e de reforma aos movimentos críticos
A secularização da busca do saber, do ‘espiritual’ ao ‘intelectual’
O messiânico e a democracia
1. Nesse texto sobre as ciências das
sociedades não aparece sequer a palavra ‘secularização’, o que não impede que a
questão lá esteja, mas não elaborada de forma explícita. Ora, com a leitura de
alguns textos sobre ela na revista Noésis (univ. Nice) sobre Philosophie et religion aujourd’hui[1] estimularam a pensar, dei-me conta de como textos
que fazem actualmente autoridade na questão, mormente Le désenchantement du
monde de Marcel Gauchet, me
parecem falharem aspectos fulcrais do fenómeno da diminuição drástica das
práticas e crenças religiosas nas sociedades desenvolvidas do Ocidente,
nomeadamente nos últimos 50 anos. A tese da substituição das funções anteriores
das igrejas pelas da escola (§ 26 do texto de referência) permite entender o
ponto essencial da secularização, desde que se acrescente, para se perceberem
as razões estruturais do processo, que o cosmopolitismo helenista do império
romano já consistiu na época numa forma de modernidade secularizante.
Cosmopolitismo e secularização
2. Em que é que consiste o
cosmopolitismo? Na colocação do mecanismo que define o que chamamos
modernidade: a avaliação critica dos saberes recebidos dos Antepassados que permitiam que as sociedades se reproduzissem,
as novas gerações aprendendo com as adultas os usos e costumes dessa
reprodução. Esta transmissão continuou a fazer-se nos meios agrícolas e
pastoris em que a inovação é muito lenta (os ‘pagi’, camponeses fixados à
terra, que resistiram ao cosmopolitismo e depois ao cristianismo como religião,
serão chamados os ‘pagãos’), mas as cidades, sobretudo as grandes metrópoles
(Atenas, Roma, Alexandria, Antioquia, Constantionopla), conhecem por um lado
uma inovação razoável de usos e por outro uma mistura de tradições ancestrais
de costumes religiosos, com atenuação gradual da própria tradição genealógica
(menos nas casas de grandes heranças). É aonde a escrita permitiu, desde os meados
do milénio antes da nossa era, a formação de escolas de exercícios
espirituais – Zaratustra na Pérsia
(sec VIII), Lao-Tseu e Confúcio na China (sec. VI-V), Buda na Índia (sec.
VI-V), os Profetas em Israel (s. VIII-VI), também Heraclito, Parménides,
Pitágoras, Sócrates na Grécia (s. VI-V) – em torno dos textos dum Mestre que
rompera com os usos dominantes, religiosos inclusive, da sua sociedade
(riqueza, glória da guerra, luxos da mesa e do corpo) e propunha outras
intensidades para o viver, a sabedoria, a temperança, a virtude, como é claro
na Apologia de Sócrates e no Fédon, um misto do que chamamos intelectual com o que chamamos espiritual. Foi
nomeadamente onde Sócrates inventou a definição que Platão e Aristóteles utilizaram, este último
abundantemente, nos seus textos gnoseológicos a que chamamos filosofia. Esta
avaliação critica de escolha (‘heresia’ em grego) do recebido tradicional holístico, isto é válido para todos (holoi), em que consiste a religião, institucionalizou-se como escola, a qual substitui a relação de aprendizagem das
casas, entre pais e filhos, por uma relação entre mestres e discípulos exterior
à ordem do parentesco, à hereditariedade e à herança das casas. Esta substituição
é o princípio da secularização, o
paralelo entre as duas formas de herança – a da economia das casas e a da
transmissão escolar de saberes além dessa economia – é a trave mestra de qualquer modernidade. A relação
holística religiosa em torno do sagrado, pertencendo à ordem do parentesco e da soberania, é substituída por uma
relação cultural, que
privilegia os antepassados da escola, guardando os seus nomes e os seus textos.
A antiguidade grega e romana foi já uma modernidade[2],
em que escrita e leitura supõem uma invenção técnica relativamente desenvolvida
em termos de divisão do trabalho nas cidades.
3. Mas esse cosmopolitismo não
resistiu ao desmoronar das grandes metrópoles onde houve a sua possibilidade e
a religião holística voltou ao Ocidente, como Cristandade: o que fora
inicialmente forma marginal de ‘leitores’ de textos espirituais tornou-se um
fenómeno de religião global a várias sociedades, acima das suas variadas
genealogias. Como o Judaísmo no tempo do domínio persa, o Budismo provavelmente
na Ásia, o Islão alguns séculos depois, esta religião com textos cobrindo
várias sociedades formou-se segundo duas camadas sociais: na Cristandade, dum
lado a dos clérigos, capazes de lerem os textos, do outro a dos leigos
analfabetos, camponeses mas também artesãos das vilas e nobres guerreiros. A
genealogia religiosa cristã sobrepôs-se às genealogias de parentesco, como
aliás já sucedera no mundo israelita nos séculos VI-V, o livro bíblico da Tora,
resultante da escrita profética, tendo-se imposto na formação do judaísmo, o
que veio a gizar várias escolas de interpretação dos textos como movimentos
espirituais, de que o cristianismo é exemplo nos séc. I-II: heresia do
judaísmo, platonizada por Orígenes de Alexandria no alvor do s. III, o que o
tornou também em heresia de Atenas. O que a Cristandade medieval significou foi
que no cosmopolitismo antigo a escola não chegou a ser obrigatória; foi
necessária uma boa dezena de séculos até ao ressurgir dum novo cosmopolitismo,
de cidades de artesanatos e comerciais em expansão e Renascimento humanista,
que veio a tornar possível a industrialização, cuja secularização substituiu as
igrejas por uma escola agora holística.
4. Uma vantagem de se considerar a
diferença entre religião e movimentos espirituais em torno de textos escritos
(a nova religião escondeu a Bíblia em latim) é de permitir compreender como a
leitura dos textos evangélicos foi sempre fomentando fenómenos espirituais
(mosteiros, conventos, frades) e mesmo, aquando do alvor das comunas dos séc.
XII e XIII, gerou escolas universitárias, entre o escolar e o eclesiástico religioso (§ 24). Ora, este espiritual-e-intelectual
nas margens da Cristandade teve efeitos críticos sobre esta, com apelos à reforma do aparelho eclesiástico encostado ao poder politico
das armas, o que veio a ter, a partir da produção industrial de livros na segunda metade do século XV e as traduções
vernáculas da Bíblia, como efeito o grande cisma cristão que cindiu as sociedades
do norte da Europa de línguas não latinas do sul latino e católico romano. As
diversas confissões protestantes organizaram-se todavia como religiões holísticas
(como testemunham as guerras de religião que se seguiram) mas, com a leitura da
Bíblia no centro da piedade, as reformas espirituais da Reforma e os ‘revivals’
foram-se disseminando de forma cosmopolita clara.
5. Mas enquanto a forma de riqueza tiver a sua
base na agricultura e a maioria das populações for feita de camponeses, ciosos
da fecundidade dos seus campos e rebanhos, os rituais religiosos continuam a
ser praticados no mundo rural e nas pequenas cidades, onde quase não haja
escola. A secularização actual vai bastante além do cosmopolitismo das
sociedades de energia apenas biológica, ela tem uma outra fonte muito clara que
no § 26 é enunciada assim: a grande diferença entre as sociedades europeias
clássicas e as da modernidade é de ordem energética, contraposta às formas
biológicas das sociedades de dominância agrícola e pastoril; a partir da
invenção da máquina a vapor, a energia será doravante produzida
industrialmente, com dois grandes saltos posteriores, o da electrificação
social e o da electrónica. A fecundidade dos campos, misteriosa até à biologia molecular dos meados do século XX,
cede à produtividade devida às
máquinas do saber científico e técnico. Este ponto nenhum dos vários textos
sobre secularização na dita revista tem a menor noção de como é crucial na
secularização moderna, a torna bem mais conseguida do que a da Antiguidade.
O espaço de saber espiritual
6. O que é que fez a escrita no
cosmopolitismo? A “invenção da transcendência”, disse Gauchet, além da
imanência, pois: inventou saberes além da economia das casas e das cidades, da guerra e do comércio, das honras
das riquezas e do poder. Inventou um espaço de espiritualidade, autónomo dos
usos quotidianos e critico eticamente da super-estrutura de poder (social,
político, religioso): de busca de sabedoria, de pensamento verdadeiro (invenção
socrática da definição), de amor, amizade e beleza, de ética, de conhecimento
das coisas, ciências e lógica (Aristóteles), de busca de saberes sem utilidade
imediata, o equivalente no que à escrita e discussão diz respeito ao desporto
olímpico no campo dos atletas da física. Saber de ociosos (scholê, ócio, lazer) que não trabalhavam de suas mãos
(tinham escravos para isso), saber do que ia além do que se via crescer e
mudar, desse ‘além’ nos ficando o prefixo ‘meta’ dos textos aristotélicos que
se seguiam aos da physica, ou o latino ‘sobre’ da teologia da ‘graça
sobrenatural’. Saber metafísico e sobrenatural, que os modernos pejorativamente
chamam ‘especulativo’, mas foi dele que sábios burgueses testaram saberes
desses em aparelhagens (físicas) que ‘laboravam’ produzindo movimentos que
mediam, que homens como Galileu e Newton retiraram um saber novo, que se veio a
revelar capaz de energias inesperadas e de máquinas que trabalham a partir
delas, saber que se veio a revelar fecundo duma modernidade inédita, além da
physica aristotélica dos vivos, duma modernidade ‘metafísica’ e ‘sobrenatural’
(em seus prodígios que nos maravilham). Que esta maneira de dizer sublinhe como
a ética e a espiritualidade foram o rasgão que os nossos antepassados deram ao
social criando novos saberes, que ela nos ajude a ofuscarmo-nos de ver as suas
heranças nas mãos de ‘especuladores financeiros’ que não vêem um palmo à frente
do nariz (ai de nós!).
7. Já agora, há que acrescentar (num
domínio a que o meu apelido deveria me ligar mas a que sou alheio de educação,
hélas!) que também as artes – poesias, músicas, pinturas, esculturas,
arquitecturas – relevam desta maneira de se pensar a diferença espiritual, já
que usam meios de usar quotidianos de forma não utilitária, transcendendo, indo
além da utilidade da
reprodução da habitação, das necessidades da vida ecológica, sem sair todavia
do seu horizonte, ‘sensível’ como se diz, já que esta necessidade da arte
manifesta assim – na imanência do material que trabalha, elabora, transformando
matéria – a gratuidade da doação da própria condição ecológica e humana. Por
isso as artes apareceram em situações rituais, repetições que traziam pujanças
ancestrais, os Mortos fecundando mitologicamente os vivos.
A secularização económica
8. Se a palavra ‘secularização’ foi
forjada para dizer a maneira como a Revolução francesa se apropriou dos imensos
bens eclesiásticos franceses – do campo do ‘sagrado’ ao do ‘século’, como era a
maneira clerical de falar do mundo profano e ‘temporal’ dos leigos, que eles,
clérigos, ocupavam-se da ‘eternidade’ –, há que voltar à Cristandade medieval
para entender as razões históricas do processo. Como foi ilustrado por G.
Bataille em La part maudite,
um livro de economia geral, além do utilitário e mercantil de que a ciência
económica se ocupa, o excesso da economia medieval, sem comércio digno desse
nome, era desviado para o campo do sagrado, catedrais, abadias, conventos; o
livro de Jacques Le Goff, O nascimento do purgatório, permite compreender como essa invenção
teológica, um terceiro lugar provisório entre céu e inferno – nestes a Igreja
não tinha poder – em que as almas iriam para o céu depois de purificadas,
durante um período que as esmolas e missas de sufrágio, além daquelas obras
eclesiásticas, poderiam abreviar. Era uma economia ‘transcendental’, que em
Portugal ainda se manifestou na primeira metade do século XVIII com D. João V e
o convento de Mafra.
9. Ora, a Reforma de Lutero pôs essa economia
directamente em questão. Tendo visitado Roma na época em que se construía a
Basílica de S. Pedro, reagiu violentamente contra a pregação de “indulgências”
a favor das almas do purgatório, cuja ‘venda’ tinha essas obras como objectivo.
A sua dicotomia célebre entre “a fé e as obras”, excluindo estas (e a própria
noção de purgatório) da salvação das almas que só a “fé” justificava, teve como
consequência o encerramento dos conventos do mundo protestante, os quais
foram assim secularizados de boa vontade, por razões evangélicas, cerca de três séculos antes dos revolucionários
franceses seguidos de outros latinos terem secularizado à força os bens
católicos, vistos como inúteis pela nova economia mercantil em vias de industrialização.
Max Weber assinalou na sua A ética protestante e o espírito do capitalismo, como o próprio Lutero fez a transição do termo
‘vocação’ (Beruf) do mundo
religioso que ele reformara para o uso profano profissional que se
institucionalizou: celebrou assim a secularização, poupando aos povos nórdicos
a peste do clericalismo e do anticlericalismo (após as guerras da religião) e
fomentando, com o mercantilismo, o que Marx chamou a acumulação capitalista que
tornou possível a industrialização.
A “instituição” secularizada: da Igreja romana ao Estado do século XIX
10. A tese é do alemão Carl Schmitt,
teórico do direito (católico e nazi), que pretendeu que “todos os conceitos do
poder legislativo e da metafísica aparecidos na Europa no decorrer da história
dos últimos séculos e que exerceram uma influência na formação da sociedade,
provêm da supremacia da Igreja romana na Idade Média, e mais, relevam do facto
de que essa Igreja, como diz Schmitt, é ‘em larga medida, a que transporta o
espírito jurídico e que é a verdadeira herdeira da jurisprudência romana’ ”
(André Doremus, La théologie politique de Carl Schmitt[3], p. 31). É fácil de presumir que ao ser institucionalizada
durante o século IV, de Constantino a Teodósio, a igreja de Roma tornou-se
‘romana’, substituindo formas litúrgicas e organizativas da religião civil que
se esgotara (o Papa como ‘Sumo Pontífice’ e a sua ‘Cúria’ são ainda hoje termos
herdados assim), mas quando as formas do Estado imperial se esvaziaram, elas
como que foram continuadas à maneira de uma instituição religiosa que ganhará
funções cívicas administrativas. Ora, que essa instituição com uma rede de
bispos e clérigos espalhada pela geografia da cristandade tenha adoptado uma
forma de celibato para todos os seus funcionários religiosos, fosse mais ou
menos cumprida de facto mas entendida como devendo-o ser, é algo que merece ser
sublinhado: a relação mestre / discípulos própria da escola espiritual e intelectual,
distinta da de pai / filhos mas pensando-se na sua matriz parental (‘padre’),
reforça uma distinção provavelmente inédita historicamente entre as duas
esferas, a da economia e parentesco por um lado, a da instituição do “governo das almas”[4]
e (politica) dos lares por outro. Que as universidades tenham mantido durante
séculos, mesmo após o cisma do século XVI, a teologia como disciplina de topo e
a filosofia como a sua ‘serva’ (ancilla), isto é, um discurso que busca esclarecer e justificar o outro, que é
posto como proeminente mas cujo texto base, o bíblico, não tem meios para essa
busca teórica, eis o que parece explicar que “todos os conceitos significativos
da doutrina moderna do Estado”, diz o terceiro capítulo da Teologia politica (C. Schmitt), “são conceitos teológicos secularizados. E isso não apenas pela sua evolução histórica,
já que eles foram transpostos da teologia à doutrina do Estado, como por
exemplo no caso do Deus todo poderoso tornado o legislador omnipotente, mas
também na sua estrutura sistemática, cujo conhecimento é necessário para
observar estes conceitos dum ponto de vista sociológico” (Doremus, p. 27).
Depois de citar a ‘vontade geral’ em Descartes e Rousseau, Doremus exemplifica
como “das leis da natureza, tais como Descartes, Malebranche e Leibniz as desenvolvem,
decorrem já em d’Holbach as ‘leis do desenvolvimento económico’ a que o Estado
tem que se submeter” (Doremus, p. 44).
Breve caracterização do messiânico
11. Além desta perspectiva dum
cristianismo secularizante vinda da jurisprudência, poder-se-ia aproveitar a
boleia que ela oferece partindo duma outra visão do cristianismo mais
integrada, se dizer se pode, retirada da minha leitura dos evangelhos num texto
inédito[5].
Os dois primeiros a serem escritos, o de Marcos e o de Mateus, inserem-se numa
perspectiva apocalíptica, anunciando logo de entrada o fim dos tempos para
breve, o que tem como incidência a radicalização das posições: Jesus forma com
os seus discípulos um movimento messiânico que propõe três oposições
politico-espirituais (estas duas dimensões no contexto apocalíptico são
indissociáveis): “Deus de vivos / Deus de mortos” (Mc 12, 27, Mt 22, 32, também
Lucas 20, 38) “Deus / Dinheiro” (Mt 6, 24, Lc 16, 13) e “Deus / César” (Mc 12,
27, Mt 22, 21, Lc 20, 25). O que significam estas oposições?
12. Em que é que consiste o “Deus de mortos”? A
discussão passa-se no Templo que Jesus desembaraçou violentamente do comércio
que nele se fazia em função dos sacrifícios do culto e pode dizer-se que na economia
dos textos evangélicos (excepto no de João) o Templo é o Adversário simbólico
do Messias: o “Deus de mortos” é o Deus desse Templo. Numa outra passagem de
Lucas (9, 60), o termo ‘mortos’ é usado de maneira equivalente; a alguém que
quer seguir Jesus como discípulo mas pede para que o deixe primeiro ir enterrar
o seu pai, a dura resposta é esta: “deixa os mortos enterrar os mortos deles”,
o zelo religioso é desqualificado de forma apocalipticamente radical. Em
resumo, o “Deus de mortos” é o da religião hierarquicamente instalada como um poder
social, bem dissociado do “Deus
de vivos” de quem o movimento messiânico se reclama, no caso como aquele que
ressuscitará todos os mortos no final dos tempos anunciado para breve.
13. A oposição a César é entendida habitualmente
de forma anacrónica, como se se tratasse duma repartição de actividades, um
pacto entre dois ‘poderes’ substantivos: ao poder do Estado o que lhe compete,
ao mundo eclesiástico a sacristia e o seu rebanho de pastores. Mas uma leitura
atenta do episódio que culminou nessa frase mostra o anacronismo que seria
deixar-se todo o domínio de César ao seu arbítrio. Trata-se com efeito de uma
armadilha: “é ou não lícito pagar o imposto a César?”, questão politica por
excelência num pais ocupado militarmente pelos exércitos de César para
justamente cobrar esses impostos. Se Jesus disser que não é lícito, será
denunciado à autoridade romana ocupante, a quem esse imposto se destina; se
disser que sim, será abandonado pela multidão anti-ocupação romana que o
aclamou à entrada em Jerusalém e à expulsão dos comerciantes do Templo, deixará
portanto de ser perigoso. Se a resposta de Jesus fosse a que hoje corre, ele
teria caído na armadilha e teria sido renegado pela multidão, o que obviamente
não sucedeu: a resposta não foi a dum ‘colaborador’ com o ocupante. A astúcia
de Jesus foi pedir a moeda e pegar pela imagem de César nela: a Lei bíblica
proíbe as imagens de humanos, aquela imagem é pois ilícita, estrangeira,
mandá-la para César equivale a expulsar a moeda do pais, o que por um lado convém
à multidão que o aclama e por outro não dá pretexto a acusação aos Romanos. “E
eles ficaram espantados” com a resposta, concluem os três evangelhos. César é a
cabeça do poder politico e dos
seus exércitos, oposto ao Deus de vivos de que o movimento messiânico se
reclama; no livro do Apocalipse, César é o adversário do Messias.
14. Quanto à oposição de Deus ao Dinheiro, há que
dizer que o que provoca algum espanto é a importância politica dessa oposição
já nessa época, algumas parábolas aliás testemunhando da divulgação do comercio
e do dinheiro na Palestina ocupada. Proposto como equivalente às trocas de
coisas produzidas, a sua acumulação em mãos dos senhores de casas ricas torna-o
capaz de poder económico sobre
os que têm que trabalhar para receber um salário de sobrevivência.
15. Em todas as estruturas que consolidam um poder, ‘substantivo’ de uso corrente, este tende a impedir o que os seus subordinados podem, ‘poder’ agora como ‘verbo’. O motivo evangélico
do serviço extremamente radical
– “vocês sabem que os que são vistos como chefes das nações mandam nelas como
senhores e que os grandes fazem sentir o seu poder sobre elas; não deve ser
assim entre vocês: pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vocês,
far-se-á o vosso servo e quem quiser ser o primeiro entre vocês, far-se-á o
escravo de todos” (Mc 10, 42-44) – pode ser lido como fomento das possibilidades
dos que estão sujeitos aos poderes, ajudá-los a libertarem-se para o que possam fazer e ser. O que significa que se há uma ética
messiânica, ela não consiste em
virtudes pessoais das almas, numa moral de indivíduos como a dos 10 Mandamentos
da Bíblia hebraica, rebuscada pela cristandade e ensinada nos catecismos, mas
numa ética de amor do próximo,
de solidariedade, que tem a ver directamente com o mundo social, com a inversão
do seu poder. Foi esta ética que propuseram constantemente os movimentos
espirituais que sempre foram surgindo nas margens dos aparelhos eclesiásticos,
uma ética de vivos assim testemunhada bem além dos que a professavam. Porquê
chamar-lhes ‘messiânicos’? Para marcar a radicalidade apocalíptica em torno da
figura escatológica do ‘Messias’, termo vindo hebreu que em grego se traduziu
para ‘Cristo’ e rapidamente perdeu a perspectiva escatológica hebraica, tornado
no mundo greco-romano o apelido de ‘Jesus’. A palavra cristão traduz messiânico, a palavra cristianismo
traduz messianismo.
16. Com efeito, durante dois séculos e meio, o
movimento espiritual, messiânico ou cristão, perdida a esperança apocalíptica
breve, disseminou-se nas cidades do império romano, mal tolerado e por vezes
perseguido cruelmente, manifestando todavia uma relativa frontalidade aos três
emblemas simbólicos que cativavam os desejos dos pais de família em ordem à
relativamente ordeira reprodução social que os três poderes, religioso,
imperial e económico procuravam assegurar tanto quanto possível: o dinheiro
permitia que as trocas económicas tivessem alguma racionalidade, o imperador
velava para que o direito se cumprisse assegurando as armas a boa ordem, os
sacrifícios religiosos procuravam ganhar a bênção dos Deuses que detinham o
segredo da fecundidade dos campos e dos rebanhos; em resumo, os emblemas do
poder eram necessários para que, melhor ou pior, a sociedade funcionasse. Ora,
o cristianismo, como o budismo sem dúvida, de movimento espiritual que, exilado
da Palestina de origem e da esperança messiânica breve, guardou da sua dimensão
politica apenas a resistência às perseguições durante esses dois séculos e
meio, veio ao longo do século IV a ocupar o lugar de religião do império,
rapidamente aliás tomando atitudes de poder persecutório contra a antiga
religião oficial e contra os outros cultos espirituais, filosóficos inclusive.
Donde que o messiânico se tenha deslocado para as margens do mundo religioso,
retomando nas vidas de eremitas, monges, frades, etc., o desígnio do amor do
próximo e do serviço, segundo as três oposições evangélicas. Mas nas gerações
seguintes, conventos e ordens mais ou menos se integraram no mundo
eclesiástico, abrindo caminho a futuros movimentos espirituais.
Dos movimentos espirituais e de reforma aos movimentos criticos
17. Sejam três observações gerais. Uma diz
respeito à maneira como os mosteiros beneditinos, entre os primeiros movimentos
espirituais a institucionalizarem-se, teve como desígnio ora et labora, colocando o trabalho considerado servil, próprio
dos escravos e dos servos, no lugar nobre da instituição, em comum com a
oração. A noção de ‘serviço’ fazia pois parte estrutural dela, ainda que entre
os trabalhos dos mosteiros houvesse também os que diziam respeito aos
manuscritos que eles copiaram, permitindo um mínimo de transmissão do acervo da
Antiguidade greco-romana. A segunda consiste em sublinhar o sentido da palavra
‘ministro’ que designa nos países ocidentais os lugares proeminentes da governação
e do poder. Ora, em latim, o magister e o minister eram o senhor
das casas ricas e o respectivo escravo, o ‘magis’ e o ‘minus’, o maior e o
menor. Que o termo que dizia o escravo se tenha tornado o que diz os lugares de
poder, é um sintoma de secularização: os chefes cristãos ainda não tinham
esquecido a injunção do serviço ao invés das nações, e o termo secularizou-se
invertendo o sentido semântico da palavra latina. A terceira diz respeito à
maneira como os juros de empréstimos foram proibidos na cristandade, segundo a
Bíblia hebraica que só os permitia a estrangeiros (Deuteronómio 23, 20-21):
donde que cristãos não podiam emprestar a cristãos nem judeus a judeus, mas
estes, minoritários, podiam emprestar a cristãos, o que explica historicamente
o lugar proeminente que alguns tiveram na história das finanças europeias. O
mundo católico após a Reforma manteve essa proibição até 1745 (encíclica Vix
prevenit), onde o ‘atraso’ capitalista desse mundo se sublinha historicamente e
que a admissão da cobrança dos juros no sec XVIII se mostra como secularização.
18. A reclamação da reforma da estrutura
eclesiástica na chamada Alta Idade Média, os séculos das comunas e das
universidades, é um movimento cujo fôlego é simultaneamente espiritual, nas
suas motivações, e politico nos seus objectivos, que visam uma estrutura
eclesiástica com dominação temporal frequentemente (no Estado pontifício
romano, em feudos de Abadias e Arcebispados) e enredada ao poder feudal nas
outras regiões: sintoma de como esse conluio se manteve no mundo católico até
ao século XX são as capelas dos palácios nobres com os respectivos capelães na
sua casa civil. Ora, essa reclamação é uma atitude ‘moderna’, faz-se a partir
da leitura critica dos textos evangélicos e da sua injunção de serviço, das
três oposições aos emblemas dos poderes sociais. Assim os socialismos utópicos
terão frequentemente motivos cristãos explícitos, como é o caso do inglês G.
Winstanley (sec. XVII), desde os tempos medievais que as ditas heresias
(Valdenses, Joaquim Fiore, Jan Hus, Muntzer, Anabaptistas) foram suas
antepassadas. A filosofia de movimentos espirituais como a chamada devotio
moderna ou o pietismo, será de
ordem platónica, vincando tudo o que é invisível, destacando-se inclusivamente
da própria liturgia e dos seus rituais. É a salvação das ‘almas’ após a morte
que, como sempre, é o mote decisivo, mas ainda com referências às oposições
evangélicas: poder-se-á dizer que a secularização encontrará no fôlego destes
movimentos um suporte que traz os objectivos de mudança para o social e
politico deste mundo. Mas o próprio marxismo se formulou teoricamente a partir
duma ‘inversão’, que se pode dizer secularizante, da dialéctica hegeliana e da
sua matriz teológica: a solidariedade cristã do amor do próximo pode-se dizer
que é revertida secularmente no lugar essencial do proletariado na revolução
comunista. Completar-se-á assim em parte, que se trata aqui de questões que
nunca trabalhei, a perspectiva sobre a secularização política aberta por C.
Schmitt.
A secularização da busca do saber, do ‘espiritual’ ao ‘intelectual’
19. Se a Physica de Aristóteles é “o livro de fundo da filosofia
ocidental” (Heidegger), isso foi devido à maneira como Tomás de Aquino o
introduziu no pensamento medieval: desde ele até Galileu pelo menos que se lhe
chamou “O Filósofo”. Ele ganhou com efeito o lugar proeminente nas
universidades em que a Teologia era a disciplina principal, de que a Filosofia
era a ‘ancilla’, como disse acima. Aonde quer que, do século XVI ao final do
XVIII, se encontrem autores para dizerem mal de Aristóteles, quase todos os
modernos, temos aí a confissão de que foi com ele que aprenderam a pensar e a
criticar, e que o criticaram também a ele. Se o anti-aristotelismo é pensar
‘contra’ Aristóteles, é sempre o segundo tempo dum pensamento que foi feito a
partir dele. Galileu di-lo claramente no Diálogo dos grandes sistemas: “Aristóteles retirado da sua cátedra, a quem
recorreríamos nós para pôr fim às nossas controvérsias? Que outro autor seguir
nas escolas, nas academias, nas universidades? Que outro filósofo tratou de
todas as partes da filosofia natural com tanto método, sem negligenciar a menor
conclusão particular?” (ed. 1966, pp. 161-2). Ora, a critica da modernidade é
anti-aristotélica: é Platão, o mestre que ele criticara na Academia, que ocupa
agora a posição critica. Os seus textos foram traduzidos para latim na segunda
metade do século XV – à boleia dos livros impressos, das naus atlânticas e do
humanismo renascentista por estava a começar a modernidade europeia –, abrindo
a possibilidade de o platonismo de Descartes (penso = existo como coisa cogitante) se tornar por sua vez crítico do aristotelismo e
fecundar cientistas e filósofos europeus, formados na universidade com as
problemáticas e conceitos de Aristóteles mas sendo na sua maioria enquanto
inventores marginais à universidade, até que as reformas desta no século XIX, a
partir de Humboldt, desalojou a teologia e o aristotelismo de vez e entregou a
formação dos estudantes aos cientistas e aos pensadores modernos. Esta marginalidade
do pensamento e do ‘labor’ científico que veio a fecundar a modernidade pode
ser lida como um fenómeno de secularização, a do ‘sopro’ para a razão e a
liberdade: em vez de irem para os movimentos espirituais nas margens das
igrejas, os jovens foram para os movimentos intelectuais as margens da escola,
criando as condições da sua reforma, que a pudesse tornar na instituição
holística do mundo do saber e da busca da sabedoria, substituindo as igrejas
cristãs.
20. Ora, esta secularização da busca
do saber fez-se pela escola mas também pela edição industrial de livros desde o
sec. XV, sem a qual a escola não se teria expandido. A edição de jornais, que
se generalizou lentamente a partir do sec XVII, veio criar condições de debate
politico, fomentando uma opinião pública entre os s suficientemente escolarizado que sofreu um incremento notável
no sec XIX com a generalização da escola e dos movimentos políticos e
sindicais. É no sec XX todavia que há uma mutação deste fenómeno, que se
caracterizou por aquilo que os americanos chamaram ‘médias de massa’ com sons e
imagens em movimento, rádio, cinema, televisão, discos, com expansão paralela à
da formação do que se chama ‘classes médias’, caracterizadas pela urbanização
em apartamentos de prédios, pela escolaridade liceal e por ofícios em
escritórios e equivalentes. Há dois grandes tipos de modo de produção destes
médias, os que distribuem geograficamente o que produzem, livros, jornais e
revistas, discos, filmes, e os que emitem directamente a sua produção por ondas
electromagnéticas recebidas em antenas nas residências familiares. Ora, este
tipo de produção de imagens, músicas e discursos, em que é de sublinhar a sua
incompatibilidade com os livros, ganhou um alcance holístico que prolonga o da
escola obrigatória e concluindo de facto a substituição das igrejas holísticas
de antanho. Mas ambos estes tipos de produção, por distribuição geográfica e
por emissão de ondas para antenas, jogam o que se chama ‘comunicação social’ de
forma unidireccional, de emissores para consumidores, o controle democrático
fazendo-se por via da publicidade, cujas finanças procuram os médias de maiores
audiências e tende pois a uma mediania, senão a uma ‘mediocridade’ que bate
certo com ‘médias’ para classes ‘médias’. Provavelmente como as medianias
religiosas de outrora.
O messiânico e a democracia
21. É aqui que a Internet, a ‘rede
entre’ computadores, aparece com uma novidade que pode oferecer possibilidades
de ‘comunicação social’ sem a estrutura unidireccional de emissores para
consumidores, já que a existência de publicidade e o papel dos ‘servidores’ não
interfere directamente com o jogo dos utentes em seus computadores e equivalentes:
embora este jogo também tenha a ver com os usos gerais dos outros médias e com
as suas ideologias, esta ausência de pólos de produção de discursos aproxima-se
mais da concepção de democracia à maneira de Claude Lefort, embora se deva
ressalvar que os médias, desde a televisão que parece manter um lugar
proeminente, estão abertos a correntes de opinião razoavelmente contrárias e
contraditórias entre si, com excepção é certo das propostas ‘extremas’ em
relação às medianias correntes: privilégio das médias (estatísticas) e dos centros,
com alguns ‘pensamentos únicos’ em economia e finanças.
22. Segundo Lefort, que cito de
segundas mãos, a democracia define-se pelo lugar vazio do poder politico, vazio de ideologia,
entenda-se, do nazismo como do comunismo, de qualquer partido politico que, de
‘parte’ que exclui as outras ‘partes’, se situa como ‘parte única’, vazio de
‘verdades’. Como deveria excluir o pensamento neo-liberal que hoje predomina na
União Europeia e tanto mal nos fez: as decisões politicas fazem-se a partir de
debates da opinião pública, entre os que (partidariamente) das suas ‘partes’
relevam. O ‘poder’ (-cracia) do ‘povo’ (demos-) em seus conflitos, insiste Lefort. O que chamei messiânico – motivo de filosofia politica de vários autores
de confissão judaica que não li[6]–
desenha o horizonte da democracia, que, tal como a justiça e a paz, nunca estão
realizadas, são sempre a recomeçar. O que não significa um adiamento sistemático.
Com efeito, pode-se dizer que a Cristandade medieval, que os movimentos
espirituais ‘contestaram’ vitalmente, foi organizada sob a égide do ‘Deus de
mortos’ e que a sequência das guerras de religião dos sec XVI e XVII foi, em
França nomeadamente, os regimes absolutistas de ‘reis pela graça de Deus’, em
que o ‘Deus de mortos’ ficou no lugar de cobertura de César, até que a
revolução francesa viesse decapitá-lo, republicanamente. Reis nórdicos e
presidentes da república ocuparam o lugar burguês de César, de que Hitler,
Mussolini, Salazar e outros se apoderaram como afirmação de César “acima de
todos”, de quem os parlamentos democráticos devem limitar os poderes. A
globalização financeira e cibernética veio a delimitar o ‘poder politico’
quando o religioso já se tornou minoritário e os médias o substituíram: que os
Estados, governos e parlamentos, não tenham senão o poder que o sistema
financeiro, em suas concorrências especulativas, lhes deixa (um pouco como os
governos nacionais fizeram aos governos municipais), mostra como o Dinheiro
finalmente suplantou César (Kaiser, czar) que suplantara o Deus de mortos.
23. Mas não são só as finanças que
justificam que o Dinheiro seja hoje o ocupante do lugar do poder, basta pensar
no papel que ele tem em todos os orçamentos empresariais e familiares, que faz
com que ele seja o mais desejado de todos os bens (sem ser outra coisa do que
um meio de troca de bens!) por praticamente toda a gente (como atestam as
lotarias), porventura o único ‘laço social’ que nos une a todos. A questão democrática
então seria a de saber se é possível, não acabar com o dinheiro, mas, por exemplo,
tornar a redistribuição das riquezas igualitária, justa. Tratar-se-á em
qualquer caso,, na sua radicalidade messiânica, de ‘esvaziar’ este lugar de
poder social, este obstáculo democrático. Foi o que os espirituais sempre
buscaram, cuja forma secularizada hoje são os inumeráveis que dedicam as suas
vidas, ou são dedicadas porque tem que ser, a alguma das causas sociais impossíveis,
às misérias que a globalização tem fabricado por esse mundo fora. A esmagadora
maioria anónimos e tantos deles não crentes nas religiões tradicionais, os não
corruptos nas tarefas várias, económicas e politicas, mas também nos médias e
nas artes, no pensamento e na animação cultural e social.
24. As igrejas cristãs têm conhecido
crises fortes em consequência da secularização, a crise católica francesa entre
1965 e 1978 sendo contada pelo sociólogo D. Pelletier[7].
É certo que elas têm um lastro religioso terrível, como se vê com os
evangélicos americanos de extrema direita, que devem fazer perder a paciência a
tudo o que seja padres ou pastores. Mas pode-se pensar que a secularização as
empurra para voltarem a ser movimentos espirituais messiânicos no contexto da
actual modernidade, local como global, problemas insolúveis é que não faltam.
[1] Em que
publiquei o texto De la fécondité spirituelle, no meu blogue em francês sobre
questões do cristianismo.
[6] Pierre Bouretz, Témoins
de futur. Philosophie et messianisme, Gallimard, 2003. Trata de Hermann Cohen, Franz Rosenweig,Walter
Benjamin, Gershom Scholem, Martin Buber, Ernst Bloch, Leo Strauss, Hans Jonas,
Emmanuel Levinas. Não inclui todavia Derrida (não confessional?), cujos textos de ética e
politica, das duas últimas décadas da sua vida, conheço pmal.